Ele ficou ali, imóvel, em silêncio, não contei por quanto tempo,
não imaginei o que pensava. Disseram que ele depois perguntou se era possível fazer
carne moída de carne de gente. A resposta foi incerta, não havia resposta. Mas
havia ônibus, havia sirene de polícia, havia sino de igreja. Havia um menino
sentado em cima do seu caixote de engraxate frente a um outro deitado entre uma
barraca e um tapete de carne. Havia irmandade? Havia perplexidade? Havia
perguntas, muitas perguntas. O menino engraxate se foi e eu fiquei com a imagem
dele ali, vendo seus olhos percorrendo a paisagem crua de uma cidade esfolada,
judiada, abandonada, uma cidade que, de seus segredos, conserva canções,
florestas, títulos e os mais horrendos acontecimentos. Rio, a cidade maravilha é
hoje palco sustentando o cenário da igreja da chacina.
Diante da igreja, o menino da barraca pinta seu corpo de
sangue e aguarda silencioso a próxima visita.