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domingo, 17 de junho de 2012

Processo colaborativo para criação de qual dramaturgia?

Faz uns dias que eu estou me perguntando a questão acima. A criação processual e colaborativa da dramaturgia virou quase um lugar comum da criação teatral contemporânea. Dizem que tal procedimento multiplica as diferenças e pontos de vista, abrindo à dramaturgia final uma riqueza que poderia ser imprevisível caso fosse fruto direto do trabalho de apenas um par de mãos. Que assim seja - e eu bem acredito nisso - a questão que se coloca para mim é qual dramaturgia a ser criada em processo colaborativo?

Retomo um esboço da situação: seis atores, um diretor/dramaturgo, uma diretora-assistente e para além desta primeira equipe, temos ainda um cenógrafo, um figurinista, uma iluminadora e um compositor/diretor musical. Ou seja: são muitas mãos agindo sobre a criação do drama, investigando tentativas inúmeras de se mirar e atravessar um dado problema. Daí, imaginemos o que virá deste encontro: um texto de tantas páginas assinado por um dramaturgo a partir do processo que teve com toda essa equipe. Certo. É possível.

Mas e a peça?

Tenho a sensação de que a partir do fechamento do texto outro processo então deveria começar. Afinal, criamos o texto, mas e a cena? Por mais que sejam - de alguma forma - a mesma coisa (e são, ao mesmo tempo em que definitivamente são distintos), texto e cena são escrituras diferentes. São materialidades diferentes, tempos distintos e uma série de outras diferenças que precisam - eu acho - ser defendidas enquanto tal. Quero dizer: constrói-se o que colaborativamente? Um punhado de texto, de palavras em páginas inúmeras? Ou uma encenação teatral, um jogo erguido a partir de um dado material (qualquer seja ele)?

Fiquei pensando e tramando e começo a achar que o melhor neste CONCRETO ARMADO é começarmos nosso processo a partir de um texto já escrito. Eu quero dizer: por que não, como dramaturgo, oferecer ao elenco e à equipe o texto dramático, desde o início de nosso processo? Por que não começar já com um texto? Não há dúvida alguma sobre o destino dele. Este texto será destruído. A questão que se coloca é outra: sobre qual movimento vamos querer nos gastar? Sobre qual tentativa vamos suar e chorar e gritar e criar? Não acho bom que seja sobre a criação da dramaturgia. Para mim, a dramaturgia textual não é a escrita mais importante. A escrita do corpo do ator é aquilo que fica. O colaborativo é a criação da própria encenação. É a dramaturgia cênica, se assim posso escrever.

Não quer dizer que não podemos fazer o colaborativo em todas as instâncias de um processo. Mas… Se partimos do processo de criação colaborativa como aquele que multiplica o material que temos, me parece sim melhor que nos colaborativemos apenas em relação à criação da cena. A cena - em primeira e última instância - é o nosso todo. É o início e o fim de tudo. É o meio pelo qual chegaremos até você, que nos vê/lê/escuta.

E quanto à dramaturgia: deixemos que seja um pouco atrofiada. Deixemos que falte à ela alguma ousadia imprevista em palavras. Deixemos que o texto seja ainda e totalmente carente de vida, de respiração e corpo. Deixemos que o texto nasça apenas como arrepios, mas que não consuma - de imediato - o nosso corpo. O texto precisa trabalhar. Ele não é verdade imóvel no tempo. Ele precisa correr atrás dos atores. E fazer jus ao nosso momento. O texto precisa de processo. Por isso talvez já chegue pronto.

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segunda-feira, 11 de junho de 2012

Caderno de notas

Comprei um caderno vermelho. Pautado. Nele estou escrevendo tudo e mais um pouco. Neste mês de junho de 2012, estou lendo duas obras simultaneamente: 1808 de Laurentino Gomes e O Enigma do Capitalde David Harvey. Com o primeiro livro, entro em contato com a história da vinda da família real portuguesa ao Brasil, fugindo às pressas do cerco realizado por Napoleão Bonaparte na Europa. Já com a obra de Harvey, entro em contato com a crise imobiliária iniciada em 2008 nos Estados Unidos e, por consequência, a crise que se evidencia na lógica capitalista.

A leitura destas referências não pretendem nada exceto dinamitar a minha busca por alguma coisa que ainda não me importa saber qual é. Gosto muitíssimo de percorrer inúmeras referências sem saber ao certo o que procuro. Eu acredito - veementemente - que as coisas vão sendo encontradas e perdidas, que é possível e necessário se afetar não somente por aquilo que se julga conhecido, mas, sobretudo, pelo o que - ainda - não se sabe.

1808           O ENIGMA DO CAPITAL

Assim, neste caderno vermelho de notas vou registrando leituras, opiniões, vou tentando clarear o meu olhar e também inventá-lo. Estudar a história do Brasil parece um tanto frutífero, visto que começo a reconhecer no passado do Brasil uma porção de características que hoje, sem dúvida alguma, nos fazem uma nação tão colonizada como éramos antigamente. Por outro lado, ao se propor o contexto da Copa do Mundo de 2014 como ponto de partida para a dramaturgia deste espetáculo, analisar e entender a lógica capitalista de nossos tempos é uma ferramenta determinante, pois é por meio deste entendimento que se pode olhar - menos ingenuamente - em direção às estruturas que nos amarram e determinam.

Além destas duas referências, é inegável que a leitura de revistas e jornais - e sobretudo o incessante recortar dos mesmos - vão me permitindo não somente acompanhar os desdobramentos (muitas vezes trágicos, outras vezes completamente absurdos) das questões diretamente relacionadas à Copa do Mundo, mas também, me permitem especular aquilo que a dramaturgia de certa forma ambiciona por antever, por anunciar, sem total certeza de sua concretização.

Estou falando de criação. Aqui disponho os meios pelos quais me é possível tocar a questão e desbravá-la, ao mesmo tempo em que também vou criando possíveis abordagens ficcionais que de ficcionais não possuem - realmente - quase nada.

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