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quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Trechos do livro "Os Irredutíveis" de Daniel Bensaïd

Para complementar a fala do Diogo sobre a minha apresentação do livro "Os Irredutíveis - Teoremas da resistência para o tempo presente" de Daniel Bensaïd, destaco aqui algumas passagens que julgo fundamentais e muito esclarecedoras.



"[...] desde a Reforma de Lutero, jamais o mundo ficou tão sem alternativas à ordem dominante" (p. 22)

"Hannah Arendt temia que a política viesse a 'desaparecer completamente do mundo' não só pela abolição totalitária da pluralidade, mas também por sua dissolução nas águas glaciais do cálculo egoísta. A tendência à despolitização do presente confirma esse medo. O espaço público está laminado entre as pressões do horror econômico e as lamentações de um moralismo abstrato. Esse depauperamento da política e de seus atributos (o projeto, a vontade, a ação coletiva) impregna o jargão da pós-modernidade. Para além dos efeitos da conjuntura, a partir do momento em que as metamorfoses do trabalho e a inquietação ecológica evidenciam os maus-tratos contra o mundo, trata-se exatamente de um mal-estar e de uma crise na civilização" (p. 25)

"Hoje, evoca-se com cada vez mais frequência a cidadania, porque a cidade e o cidadão são maltratados pela desorganização geral das escalas e dos ritmos [...] Freud observou sobriamente que uma mudança de atitude dos homens em relação à propriedade seria mais eficaz do que qualquer preceito ético, que nada mais tem a nos oferecer além da satisfação narcisista de podermos nos considerar melhor do que os outros" (p. 26)

"[...] Os arautos do futuro que desencanta contentam-se em pregar um 'comunismo do já', concebido como 'um movimento gradual, permanente, sempre inacabado que inclui momentos de choques e rupturas'. Eles propõem 'um novo conceito de revolução', 'um revolucionamento sem revolução, uma evolução revolucionária', ou ainda uma 'ultrapassagem sem demora', em uma imediaticidade fora do tempo. Para eles, 'a revolução não é mais o que era, uma vez que não há mais momento único em que as evoluções se cristalizam', 'não há mais grande salto, grande dia da revolução social, nem limiar decisivo', mas um longo rio tranquilo de reformas gerenciais" (p. 29)

"À ameaça de incerteza, junta-se o escândalo de um futuro fechado: 'Eis-nos condenados a viver no mundo em que vivemos'. O capitalismo teria se tornado, então, o fim da história, o horizonte intransponível de todos os tempos. Não haveria mais depois, nem outro lugar. Estaríamos, a partir de então, condenados a girar em círculos numa repetição infernal das estruturas imóveis, como no pátio de um presídio [...]
Ela [A crise] sobrevém à interseção das pressões da situação e da contingência da ação. Abre uma brecha no círculo vicioso das repetições. Faz seu buraco na crosta endurecida das dominações. Semeia a desordem na rotina bem organizada dos trabalhos e dos dias. Nesses 'pontos de crise' e de 'reviravolta', a parte determinada liga-se à parte não fatal do futuro, a lógica histórica à irrupção dos acontecimentos" (p. 30)

"A política surge e inventa-se no social, nas resistências à opressão, no enunciado de  novos direitos que transformam as vítimas em sujeitos ativos" (p. 31)

"A 'refeudalização' do laço social pelo viés dos contratos interindividuais, sinônimos de subordinação pessoal, triunfa sobre a relação baseada na lei impessoal teoricamente igual para todos. Delineia-se nitidamente uma nova forma de associação capital-trabalho, da qual uma pequena camada de vencedores consegue se safar em detrimento da massa vítima do desastre da globalização" (p. 41)

"Trata-se, então, de 'completar o respeito pelo universal com a atenção voltada para as diferenças' e 'de opor uma dose saudável de ceticismo desconstrutivo a qualquer sistema classificador'" (p. 48)