\\ Pesquise no Blog

sábado, 14 de dezembro de 2013

descrição de concreto armado ii

espaço de preservação de um cotidiano lúdico e solidário

no dia 15 de dezembro de 2013, entre 10:00 e 12:00 horas, acontecerá em volta da estátua do carlos drummond de andrade; a saber: avenida atlântica na altura do posto 6 em copacabana/rio de janeiro; a solenidade de fundação do espaço de preservação de um cotidiano lúdico e solidário.

o acontecimento é fruto do encontro entre o projeto de mestrado “ da rua para o palco: percursos e metodologia de uma invenção cênica” ( estudos contemporâneos da arte/ uff) e do programa de performances concreto armado.

o evento de fundação do espaço de preservação de um cotidiano lúdico e solidário será aberto ao público transeunte, acontecerá sob sol (ou chuva) e será composto por uma série de ações simultâneas no território que circunda a estátua do nosso muito caro poeta drummond. 

a partir deste dia, no qual também realizaremos o solene momento de corte da faixa de inauguração, o micro território que se apreende do recorte feito pelas ruas julio de castilhos, av. rainha elizabeth, av. nossa senhora de copacabana e av. atlântica + a faixa de calçadão, areia e mar relativa a estas linhas, será compreendido como espaço propulsor de um cotidiano vivo, onde a utopia pode fazer morada e os sentidos poderão buscar viver de acordo com as ações.

mas viveremos

já não há mãos dadas no mundo.
elas agora viajarão sozinhas.
sem o fogo dos velhos contatos,
que ardia por dentro e dava coragem.
desfeito o abraço que me permitia,
homem da roça, percorrer a estepe,
sentir o negro, dormir a teu lado,
irmão chinês, mexicano ou báltico.
já não olharei sobre o oceano
para decifrar no céu noturno
uma estrela vermelha, pura e trágica,
e seus raios de glória e esperança.
já não distinguirei, na voz do vento
(trabalhadores, uni-vos...) a mensagem
que ensinava a esperar, a combater,
a calar, desprezar e ter amor.
há mais de vinte anos caminhávamos
sem nos vermos, de longe, disfarçados,
mas a um grito, no escuro, respondia
outro grito, outro homem, outra certeza.
muitas vezes julgamos ver a aurora
e sua rosa de fogo à nossa frente.
era apenas, na noite, uma fogueira.
voltava a noite, mais noite, mais completa.
e que dificuldade de falar!
nem palavras nem códigos: apenas
montanhas e montanhas e montanhas
oceanos e oceanos e oceanos.
mas um livro, por baixo do colchão
era súbito um beijo, uma carícia,
uma paz sobre o corpo se alastrando,
e teu retrato, amigo, consolava.
pois às vezes nem isso. nada tínhamos
a não ser estas chagas pelas pernas,
este frio, esta ilha, este presídio,
este insulto, este cuspo, esta confiança.
no mar estava escrita uma cidade,
no campo ela crescia, na lagoa,
no pátio negro, em tudo onde pisasse
alguém, se desenhava tua imagem,
teu brilho, tuas pontas, teu império
e teu sangue e teu bafo e tua pálpebra,
estrela: cada um te possuía.
era inútil queimar-te, cintilavas.
hoje quedamos sós. em toda parte,
somos muitos e sós. eu, como os outros.
já não sei se vossos nomes nem vos olho
na boca, onde a palavra se calou.
voltamos a viver na solidão,
temos de agir na linha do gasômetro,
do bar, da nossa rua: prisioneiros
de uma cidade estreita e sem ventanas.
mas viveremos. a dor foi esquecida
nos combates de rua, entre destroços.
toda melancolia dissipou-se
em sol, em sangue, em vozes de protesto.
já não cultivamos amargura
nem sabemos sofrer. já dominamos
essa matéria escura, já nos vemos
em plena força de homens libertados.
pouco importa os dedos se desliguem
e não se escrevam cartas nem se taçam
sinais da praia ao rubro couraçado.
ele chegará, ele viaja o mundo.

e ganhará enfim todos os portos,
avião sem bombas entre natal e china,
petróleo, flores, crianças estudando,
beijo de moça, trigo e sol nascendo.
ele caminhará nas avenidas,
entrará nas casas, abolirá os mortos.
ele viaja sempre, esse navio,
essa rosa, esse canto, essa palavra.
(carlos drummond de andrade)

caroline helena